CIDH Inicia Julgamento do Estado Brasileiro por Mortes de Bebês em Cabo Frio
A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) iniciou nesta sexta-feira (26) o julgamento do Estado brasileiro em relação às mortes de 96 bebês no município de Cabo Frio, no Rio de Janeiro, entre 1996 e 1997. Os casos ocorreram na Clipel (Clínica Pediátrica da Região dos Lagos), que recebia recursos do Sistema Único de Saúde (SUS).
As famílias dos recém-nascidos alegam negligência e práticas sanitárias inadequadas no local. Segundo arquivos da Corte, a Clipel foi criada em 1995 como uma clínica privada sem fins lucrativos e funcionava na área interna do Hospital Santa Izabel, como uma unidade de terapia intensiva neonatal.
Detalhes do Caso e Investigigações Iniciais
De acordo com a comissão que levou o caso à CIDH, as vítimas nasceram com estado normal de saúde e a maioria das mães não teve problemas que colocassem em risco a vida dos bebês durante a gestação. Mesmo assim, eles foram levados para a UTI por conta de diferentes complicações, como problemas respiratórios, prematuridade ou falta de vagas em outros hospitais.
Os familiares afirmam que, quando os bebês deram entrada na unidade, existia uma infecção hospitalar no local e que, mesmo sabendo dos riscos, os médicos decidiram internar os recém-nascidos no local, onde vieram a falecer. Os familiares também citam ter observado irregularidades no tratamento médico e falta de higiene.
Investigações e Processos Administrativos
Um laudo pericial elaborado pelo IFF/Fiocruz (Instituto Fernandes Figueira da Fundação Oswaldo Cruz), vinculado ao Ministério da Saúde, concluiu que a taxa anormal de mortalidade registrada na Clipel não poderia ser explicada por outros fatores além da contaminação hospitalar.
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Diante disso, foram abertos pelo menos cinco processos administrativos. O primeiro ocorreu na Coordenadoria de Fiscalização Sanitária da Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro (Cofisa), mas os familiares não obtiveram respostas sobre os desfechos da apuração. O segundo foi instaurado no Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (CREMERJ) em 1997, para apurar a conduta do diretor médico da Clipel. Em 2000, o conselho concluiu que ele não havia cometido ilícitos.
Conclusões da CIDH
A comissão entende que o Estado brasileiro falhou por não investigar nem julgar o caso de forma adequada e em tempo razoável. Também aponta que o processo ignorou fatores importantes, como a vulnerabilidade das mães no puerpério e a questão racial das famílias afetadas. Por isso, conclui que houve violação do princípio da igualdade e da não discriminação.
A comissão ainda afirma que a perda dos bebês, somada ao desconhecimento de saber o que realmente aconteceu, trouxe sofrimento e angústia para os familiares, configurando uma violação ao direito à integridade psíquica e moral dessas pessoas. Por fim, o grupo alega que a situação constituiu uma conjuntura “de risco real e iminente” aos direitos das crianças e o Estado deveria ter cumprido com seus deveres de fiscalização e supervisão.