Proposta para autorizar desmatamento e construção de indústria no Instituto Butantan será discutida na próxima semana pela Câmara de SP

A população local e representantes políticos manifestam preocupação com o potencial impacto ambiental do projeto de expansão do instituto.

15/08/2025 4:02

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Proposta para autorizar desmatamento e construção de indústria no Instituto Butantan será discutida na próxima semana pela Câmara de SP
(Imagem de reprodução da internet).

A Câmara Municipal de São Paulo realizará, na próxima semana, a votação em segundo turno do projeto de lei que propõe alterações no Plano de Intervenção Urbana (PIU) Arco Pinheiros, que engloba municípios como Vila Leopoldina, Jaguaré e Butantã.

A proposta de lei 691/2025 visa possibilitar a expansão do Instituto Butantan, elevando a capacidade de produção de vacinas, incluindo as destinadas ao HPV e dTpa (que combate a difteria, o tétano e a coqueluche). O projeto, de autoria do prefeito Ricardo Nunes (MDB), altera o coeficiente de aproveitamento máximo, que é a proporção entre a área construída e o terreno total, e incrementa o limite de altura máxima para edificações a 48 metros, o que corresponde a cerca de 15 andares.

Uma das objeções ao projeto é que a expansão deve levar à derrubada de árvores. A mata local está protegida pelo decreto estadual 30.433/1989, que a considera imune a cortes, devido à sua localização, todas as árvores existentes no Instituto Butantins. Ainda assim, o projeto inicial previa a remoção de 6.600 pés, sendo 1.500 nativas e 1.550 espécies invasoras, como a palmeira australiana, que dificultam o desenvolvimento de outras.

Na data de 5 de agosto, contudo, a direção do governo propôs uma alteração ao projeto, considerada “mais prejudicial” do que a versão inicial apresentada pela oposição. Se a modificação for aprovada, o projeto original é automaticamente rejeitado e não será analisado. Em caso de rejeição, prossegue-se à votação do texto original. O novo documento foi publicado no Jornal Oficial do Município na última terça-feira (11), um dia antes da última audiência pública.

A modificação possibilita a remoção das 6.600 árvores inicialmente previstas e viabiliza o parcelamento de toda a área, modificando o plano apresentado na audiência pública, além de criar espaço para atividades industriais de alta incômoda. O texto também autoriza a realização de eventos no local, com níveis de ruído superiores a 65 decibéis, patamar equivalente ao de áreas industriais, e permite a ampliação em 50% de empreendimentos já considerados problemáticos, como o biotério, uma instalação destinada a animais utilizados para fins científicos.

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A vereadora Renata Falzoni (PSB) considera o substitutivo “muito mais permissivo” do que o projeto original. Além de ampliar o tamanho máximo das construções, a parlamentar aponta que a proposta admite diversos usos dos espaços, incluindo o industrial com impacto urbano e ambiental. “O que está sendo proposto está completamente fora do bom senso da sustentabilidade, da preservação das nossas florestas, da permeabilidade e por aí vai. É um contrassenso, um tremendo retrocesso”, afirma a vereadora.

Falzoni também questiona o uso do solo, que seria mais amplo do que a área ocupada pelo Instituto Butantan atualmente. “O que está por trás disso? Uma especulação imobiliária? É algo que precisamos entender: qual é o motivo de ser mais abrangente do que a área de ocupação de uma possível futura fábrica de vacinas?” , questiona a vereadora.

A vereadora Marina Bragante (Rede) declara que o substitutivo agrava a proposta em relação ao cuidado e à preservação ambiental, além do cuidado com as pessoas e o impacto na vizinhança. Em suas palavras, o projeto “transforma uma região de preservação ambiental e majoritariamente residencial para uma zona industrial”, o que dificulta a vida de quem reside ali há muito tempo.

Bragante critica ainda a descontinuidade da parceria entre os vereadores, a sociedade civil e o Instituto Butantan, eliminada do texto mais recente. O que é pior é a ruptura da confiança em um processo que vinha sendo construído por diversas mãos, tanto por parte dos vereadores e vereadoras que não pertencem à base governamental, quanto da própria base, e da sociedade.

As razões.

Atualmente, a legislação paulista permite construções de até 28 metros de altura na área que abrange a Universidade de São Paulo (USP), o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e o Butantan, denominada Zona de Ocupação Especial (ZOE). O projeto determina a divisão da região em três zonas: as áreas da USP e do IPT manteriam a mesma regra, enquanto a área do instituto passaria a possibilitar novos edifícios com até 48 metros.

A justificativa indica que as alterações são necessárias para a expansão do parque produtivo, cruciais para a produção de vacinas, soros e medicamentos monoclonais, incluindo as vacinas contra a dengue, chikungunya e HPV. O texto também defende que a manutenção da estrutura existente causará a interrupção das obras.

A proposta foi aprovada em primeira votação em junho, com 33 votos positivos, seis votos negativos — todos do PSOL — e oito votos de abstenção — de PT, PSB e Rede. O assunto passou por duas audiências públicas, a última delas realizada nesta terça-feira (12). O presidente da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente e líder do governo, o vereador Fábio Riva (MDB), excluiu a possibilidade de realizar novas reuniões.

O que as pessoas opinam?

Patrícia Coelho, residente do Butantã há 25 anos e membro do SOS Instituto Butantan, expressou seu repúdio à proposta na segunda audiência pública. “Trata-se de um texto que desrespeita princípios básicos do planejamento urbano, ignora mais uma vez a participação da população e se mostra totalmente contraditório em relação ao que foi apresentado pelos técnicos e pelo próprio diretor do Instituto Butantan”, declarou Coelho em relação à redução na quantidade de árvores a serem removidas.

Os pontos do substitutivo “deixam claro que existe uma dinâmica inaceitável entre o discurso e a prática e as ações efetivas”. “A população é afastada das decisões que afetam diretamente a sua saúde física e mental. Quero reforçar que o apelo legítimo da importância das vacinas não pode ser usado como justificativa para atropelar direitos fundamentais e processos. Somos a favor da vacina, mas em local adequado e de forma sustentável. No Butantã, o que é urgente é a preservação e a recuperação ambiental do crime que já foi cometido”.

Em 2 de junho, uma comissão recebeu o diretor do Butantan, Esper Kallás, e o vereador Nabil Bonduki (PT). Na ocasião, os moradores apresentaram uma carta, afirmando que não são contra a produção de vacinas, mas defendendo que a expansão da capacidade produtiva deveria ser realizada em outras áreas da cidade, como a Fazenda São Joaquim, propriedade do instituto em Araçariguaama, utilizada para a produção de soros.

Os moradores manifestam reconhecimento da relevância da ciência e do papel do Butantan na produção de vacinas e soros para a promoção do bem-estar humano. Consideram estranho que o Instituto, notável pela pesquisa científica e pelo uso da ciência, não priorize o conhecimento técnico-científico nas decisões sobre a expansão de suas instalações, negligenciando os impactos ambientais, à saúde e urbanísticos, especialmente diante da emergência climática.

A iniciativa levanta que a edificação de novos prédios no parque, juntamente com o incremento de funcionários, intensificaria problemas já existentes devido à especulação imobiliária, tais como congestionamento do trânsito, superlotação do transporte público e maior demanda por infraestrutura. A expansão do complexo industrial também acarretaria grande circulação de veículos pesados para transporte de materiais, entrega de produtos e destinação de resíduos.

Apesar das críticas, a expansão do Instituto foi aprovada pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp) e pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat). O investimento de R$ 1,2 bilhões será financiado por recursos do Ministério da Saúde, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do governo estadual.

Fonte por: Brasil de Fato

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