Mercado avalia terreno: Afeto e pertencimento deixam de ser prioridade

Mercado em crise: Afeto e pertencimento cedem lugar ao cálculo do risco e à avaliação financeira.

27/09/2025 8:06

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SP - CÂMARA/SP/PROJETO/VENDA/ÁREAS PÚBLICAS - GERAL - Vista da travessa Engenheiro Antônio de   Souza Barros Júnior, via sem saída   entre a rua Pamplona e a alameda   Lorena, na região dos Jardins, zona   oeste da capital paulista, nesta sexta-  feira, 5 de setembro de 2025. A Câmara   de São Paulo aprovou ontem à noite um   projeto de lei de autoria da prefeitura   que autoriza a venda da travessa para   um condomínio de luxo. Na mesma   votação, foram aprovadas emendas para a   concessão de outras nove áreas públicas   da cidade.   05/09/2025 - Foto: RENATO S. CERQUEIRA/ATO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
SP - CÂMARA/SP/PROJETO/VENDA/ÁREAS PÚBLICAS - GERAL - Vista da t...

A Rua e o Futuro da Cidade

A famosa cantiga popular, “Se essa rua, se essa rua fosse minha…”, nos ensina que aquilo que pertence a todos deve ser cuidado com delicadeza. No entanto, o que acontece quando essa rua deixa de ser nossa? Quando se transforma em um corredor vigiado, cercado por câmeras, portarias e muros invisíveis, desenhados por planilhas de rentabilidade? O desejo de ladrilhar o chão com pedrinhas de brilhante – gesto de afeto e pertencimento – dá lugar ao cálculo que mede cada metro quadrado em cifras e cada corpo que passa em risco.

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A Privatização do Espaço Público

Conforme reportagem da jornalista Priscila Mengue, publicada no Estado de S. Paulo, “São Paulo tem um ‘boom’ de venda de ruas”. A onda de privatização de vielas na capital não é um episódio isolado, mas parte de uma dinâmica que transforma o que é compartilhado em ativo contábil sob controle empresarial. Nesse deslocamento, não desaparecem apenas traços do mapa: apaga-se o que sustenta a convivência entre diferentes.

As Consequências da Privatização

A questão vai além da discussão do valor pago aos cofres públicos. É preciso compreender que estamos diante de um dos “cercamentos” contemporâneos: se, nos séculos passados, cercavam-se campos e bens que sustentavam comunidades, hoje cercam-se vielas e praças. Não com cercas, mas com decretos, projetos de lei e contratos que transferem a gestão da vida pública ao comando do interesse privado. O artigo lembra que “a palavra-chave é reversibilidade”. O que se observa é o oposto: a supressão de um palco da cidadania e a restrição do acesso comum.

Um Desafio para o Futuro

O desafio não é impedir a transferência da próxima viela em pauta. É ampliar o debate e perguntar: o que estamos decidindo construir para as próximas gerações? Uma rede de muros e direitos limitados ou um meio em que o que pertence a todos permaneça democrático, aberto e vivo?

O Significado da Rua

Talvez seja hora de lembrar novamente a cantiga: “Se essa rua, se essa rua fosse minha…”. Ela não falava de propriedade, mas de cuidado; não sobre muros, mas sobre pertencimento. Hoje, ao transformar caminhos compartilhados em corredores controlados, deixamos de ladrilhar o chão com pedrinhas de brilhante e o pavimentamos com dispositivos de vigilância. A via vendida não apaga um traço do mapa – redefine o sentido da convivência. E se essa rua deixar de ser nossa, o mapa inteiro corre o risco de não nos pertencer mais.

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