O “socialista de iPhone” desafia o senso comum, revelando que a inovação tecnológica depende crucialmente de investimentos estatais. David Nemer desmistifica o paradoxo, mostrando que a Apple e outras empresas se beneficiaram de pesquisas financiadas pelo Departamento de Defesa e pela Fundação Nacional de Ciência
A discussão sobre o “socialista de iPhone” – a aparente contradição de alguém que defende políticas redistributivas e direitos sociais usar um produto símbolo do capitalismo global – revela um equívoco fundamental. A crítica, inicialmente lançada por setores da direita, se baseia em uma compreensão limitada de como a inovação realmente acontece.
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A verdade é que o iPhone, assim como outras tecnologias que moldam nosso mundo, é fruto direto de investimentos e apoio estatal.
O argumento central, defendido pelo professor David Nemer, é que a inovação não surge espontaneamente do “gênio da garagem” ou do empreendedor capitalista. Pelo contrário, a ciência básica e as tecnologias de alto risco, que frequentemente levam a avanços revolucionários, são quase sempre financiadas e desenvolvidas pelo setor público.
A internet, o GPS, os protocolos de comunicação, o sistema de navegação espacial, a inteligência artificial, os carros elétricos e até mesmo as vacinas de mRNA são exemplos concretos de tecnologias que dependem, em grande parte, de investimentos e pesquisas estatais.
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Analisando a trajetória do iPhone, percebemos que a Apple não surgiu do nada. A empresa se beneficiou de décadas de investimentos públicos massivos, de alto risco e de um ambiente tecnológico criado e mantido pelo Estado. O Departamento de Defesa dos EUA, através da DARPA, financiou a pesquisa que levou à criação da internet e de protocolos de comunicação.
A Fundação Nacional de Ciência (NSF) contribuiu para o desenvolvimento de tecnologias como TCP/IP. A Agência de Energia (DOE) financiou a pesquisa que resultou em baterias de íon-lítio. A Agência de Inteligência da CIA/DCI, através da DARPA, financiou o desenvolvimento de sistemas de inteligência artificial.
A NASA, por sua vez, financiou a pesquisa que levou à criação do GPS e de tecnologias de microprocessadores.
Além disso, a Apple recebeu investimentos específicos do governo americano. O programa SBIC (Small Business Investment Company) forneceu à empresa um investimento semente de US$ 500 mil. O sistema público de educação, nos anos 1990, atuou como comprador estratégico, ajudando a empresa a superar dificuldades financeiras.
O governo também forneceu créditos regulatórios, que foram cruciais para a sustentabilidade da empresa em momentos de crise.
A análise se estende a outras tecnologias igualmente emblemáticas. A Tesla, por exemplo, recebeu um empréstimo estatal decisivo em 2010, que permitiu a produção do Model S e a compra da fábrica em Nevada. A SpaceX, que hoje gera receita própria, dependeu do financiamento inicial da NASA e do Departamento de Defesa, que a apoiaram em seus primeiros passos.
A empresa recebeu contratos milionários para reabastecer a Estação Espacial Internacional e fornecer satélites militares.
Mesmo o Starlink, o sistema de internet via satélite da SpaceX, teve seu desenvolvimento impulsionado por lançamentos bancados pelo governo e por contratos de fornecimento para agências federais. A própria presidente da SpaceX admitiu que a empresa “estaria mancando sem o financiamento inicial da NASA”.
Portanto, o paradoxo não reside no uso de um iPhone por alguém que defende políticas progressistas, mas sim na incompreensão de que a inovação é um processo colaborativo, no qual o setor público desempenha um papel fundamental. Ao investir em ciência básica, em tecnologias de alto risco e em pesquisa e desenvolvimento, o Estado cria as condições para que o mercado possa prosperar.
Em vez de ver o uso de um iPhone como uma contradição, devemos reconhecer que ele é um símbolo da capacidade do Estado de impulsionar o progresso tecnológico e de promover o bem-estar social.
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