Fila em posto de saúde revela frustração com falta de sistema e desorganização. Histórias de dificuldades e promessas não cumpridas chocam.
A paciência se esgotou em uma terça-feira, durante a espera em um posto de saúde. A mensagem na tela – “atendimento suspenso por falta de sistema” – e o suspiro da mulher ao meu lado, revelaram uma familiaridade com a desorganização. Era como se o tempo, em vez de fluir, fosse arrancado em pequenas doses, como se estivesse sendo roubado lentamente.
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A espera se estendeu por horas, marcada por promessas não cumpridas e a história de uma vizinha que precisou vender o carro para realizar uma cirurgia. A sensação era de que o tempo ali não passava, mas sim de que estava sendo retirado, de forma sistemática.
A desilusão se manifestava em notícias contraditórias, dados que desafiavam as estatísticas oficiais e a promessa de gestores que, em seguida, negavam tudo. A confiança em informações oficiais definhava gradualmente.
A urgência se tornava constante: pagar o aluguel, manter o emprego, lidar com imprevistos e simplesmente sobreviver ao mês. A calma, antes um estado natural, transformou-se em um luxo, um privilégio restrito a quem não vivia no limite da sobrevivência.
A dignidade, em vez de ser protegida, foi substituída por alternativas precárias: horas extras, planos de saúde com cobertura limitada e gratidão por qualquer benefício.
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Aprendi a reconhecer pequenas vitórias, a “migalha de vitória”, mas a negociação constante levou a confundir sobrevivência com sucesso. A cada dia, a sensação era de perder um pouco mais, até que a normalidade se tornou uma forma de aceitação.
O assombro não vinha do absurdo em si, mas da perda da capacidade de se sentir afetado por ele. A leitura sobre desvios, má gestão e incompetência institucionalizada resultava apenas em um suspiro e em um balanço de cabeça.
O escândalo se tornou rotina, a mediocridade, a meta de um governo. A esperança, por sua vez, resistiu mais do que deveria, mas acabou adormecendo. A ilusão de uma melhora futura se desfez, deixando apenas o teatro das palavras e dos slogans reciclados, destinados a quem já desistiu de esperar.
No final, restava a terça-feira, a fila e o suspiro da mulher ao lado – um lembrete silencioso de que, para alguns, a espera nunca termina.
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