Crise humanitária global: Vácuo de financiamento e novo papel do setor privado. USaid encerrou atividades, gerando queda de 70% em repasses para OIM, ACNUR e PMA. Brasil impactado com US$ 30 milhões na Operação Acolhida em Roraima
O ano de 2024 e 2025 marca um período de profunda instabilidade no cenário da assistência humanitária internacional. A suspensão e posterior encerramento das atividades da USaid, agência governamental dos Estados Unidos, desencadeou uma crise de financiamento com impactos globais.
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Organizações internacionais, que dependiam fortemente dos recursos americanos, enfrentaram uma queda drástica nos repasses, com uma redução superior a 70% nos financiamentos para seus programas.
Essa situação crítica expôs a fragilidade de um sistema que, por décadas, contava com a estabilidade financeira dos Estados Unidos. A agência desempenhou um papel fundamental na arquitetura da ajuda externa, atuando como um pilar para organizações como a Organização Internacional para as Migrações (OIM), o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) e o Programa Mundial de Alimentos (PMA).
A retração dos recursos americanos abriu um vácuo que desafia as estruturas tradicionais de assistência humanitária.
O Brasil, apesar de não ter sido um grande receptor da ajuda da USaid, também sentiu os efeitos dessa crise. Recebeu apenas US$ 30 milhões de um montante prometido de US$ 56 milhões, o que impactou diretamente operações como a Operação Acolhida, destinada a lidar com o fluxo migratório venezuelano em Roraima.
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Essa operação, que envolve a colaboração entre as Forças Armadas brasileiras e agências da ONU, dependia crucialmente do financiamento americano para a “inteligência humanitária” – a gestão de abrigos e a proteção legal dos migrantes.
Diante da escassez de recursos, algumas organizações buscaram alternativas inovadoras. A OIM, por exemplo, aproximou-se de atores que historicamente não financiavam assistência humanitária, como o Sistema Fecomércio-RS. Em resposta às enchentes históricas que atingiram o Rio Grande do Sul em maio de 2024, a organização recebeu um aporte inédito de quase US$ 11 milhões, financiado diretamente pela federação empresarial.
Essa iniciativa, que envolve a construção de Centros Humanitários de Acolhimento (CHAs) financiados pelo Sistema Fecomércio-RS, exemplifica o que alguns analistas chamam de “neoliberalismo humanitário” ou “privatização da ajuda”.
Essa tendência levanta questões importantes sobre a responsabilidade pela assistência humanitária. A crescente dependência de recursos privados torna a ação humanitária vulnerável à saúde financeira e aos interesses do empresariado local. Além disso, a privatização pode levar a uma desigualdade de atenção entre populações vulneráveis, priorizando crises visíveis e de grande impacto para os doadores.
O episódio das enchentes no Rio Grande do Sul, com a participação de atores como Elon Musk, via Starlink, ilustra como a ajuda privada se torna rapidamente parte da disputa política e do debate público. A iniciativa do Sistema Fecomércio-RS, embora crucial para a resposta emergencial, insere a assistência humanitária no universo dos “stakeholders”, onde prioridades podem refletir visibilidade, reputação e interesses econômicos.
A questão central é se a privatização da ajuda tende a favorecer crises agudas e de grande impacto, em detrimento de situações mais crônicas ou distantes.
O futuro da assistência humanitária parece incerto, com a necessidade de encontrar um novo equilíbrio entre a responsabilidade pública e a iniciativa privada, garantindo que as populações mais vulneráveis recebam o apoio necessário, independentemente das flutuações políticas e econômicas.
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