Comitê Gaúcho do HeForShe é reativado com campanha “Fim da Linha para a Violência contra a Mulher”

Ação emprega trens da região Metropolitana de Porto Alegre para conscientizar sobre feminicídio e responsabilizar homens.

04/09/2025 15:37

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Comitê Gaúcho do HeForShe é reativado com campanha “Fim da Linha para a Violência contra a Mulher”
(Imagem de reprodução da internet).

Em Porto Alegre, na quarta-feira (3), foi lançado o projeto “Fim da Linha para a Violência contra a Mulher. O evento aconteceu na Estação Mercado da Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre (Trensurb) e também representou a retomada do Comitê Gaúcho em Apoio ao HeForShe, programa da ONU Mulheres, agora instalado na Universidade La Salle (Unilasalle), em Canoas (RS).

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O lançamento incluiu a presença do articulador nacional do HeForShe, Edegar Pretto, e do músico da banda Nenhum de Nós, Thedy Corrêa, que assume a coordenação da iniciativa no estado. A campanha conta com o apoio da Defensoria Pública do RS, Agência Moove, Trensurb, Universidade La Salle, Museu da Cultura Hip Hop e da Assembleia Legislativa do RS.

Ao Brasil de Fato RS, o presidente da Trensurb, Nazur Garcia, ressaltou a relevância da participação da empresa. “Mais de 60% dos nossos usuários são mulheres, e isso há mais de 20 anos. Dessa forma, as estações são espaços privilegiados para trabalhar a conscientização. Aqui, disponibilizamos áreas para painéis, adesivos de piso e grafite, uma por município. Também temos o Banco Vermelho, e em breve será lançado outro na estação Canoas.”

Garcia também abordou as iniciativas da empresa, incluindo as ações do Agosto Lilás e a criação de um protocolo interno de assédio com canais seguros de denúncia. “O feminicídio é o ponto final de uma história de violência que, muitas vezes, começa dentro do lar. Campanhas como essa são fundamentais. O HeForShe tem uma abordagem importante: em vez de falar apenas para as mulheres, convoca os homens a se responsabilizarem e conversarem com outros homens sobre o respeito às mulheres.”

Segundo a 19ª Edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o país alcançou um novo recorde de feminicídios, estupros e estupros de vulnerável em 2024. Foram contabilizados 1.492 feminicídios, com 97% dos casos cometidos por homens e 64,3% ocorrendo em residências. Em relação aos estupros de vulnerável, o país registrou 87.545 ocorrências, o que significa que uma mulher foi vítima de estupro a cada seis minutos.

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Defensoria Pública lança alertas sobre violência doméstica.

O promotor Rodolfo Medeiros recordou que a maioria dos feminicídios no Rio Grande do Sul acontece no âmbito doméstico. “O lema é bastante intenso: a mulher que entra no trem deveria chegar em casa e encontrar acolhimento, paz e tranquilidade. Contudo, frequentemente o destino final dela é justamente onde a violência a aguarda.”

No Rio Grande do Sul, em 2024, o Mapa de Feminicídios da Polícia Civil apurou que 72 feminicídios foram registrados, sendo que 84,7% foram praticados por parceiros ou ex-parceiros. O local da ocorrência foi a residência em 72% dos casos.

Desejamos sensibilizar não somente as mulheres acerca de seus direitos, mas também que os homens parem, pensem e reflitam. Os feminicídios têm aumentado no estado e, em sua maioria, ocorrem em residências. Queremos atuar na base, para que meninos e jovens não repitam o comportamento machista internalizado na sociedade, afirmou o defensor. Ele reforçou que a Defensoria está disponível para apoio às vítimas pelo telefone 129.

A universidade desempenha um papel fundamental na transformação social.

Para o diretor da Unilasalle, Cledes Antonio Casagrande, o engajamento com o HeForShe representa também um compromisso coletivo das instituições de ensino. “A educação desempenha um papel fundamental em qualquer contexto histórico, sobretudo na promoção dos direitos das mulheres, da igualdade e da tolerância. Frequentemente, acreditamos que o machismo é um problema restrito às gerações mais velhas, porém, os dados evidenciam que os jovens também reproduzem atitudes violentas.”

Ele argumenta que a situação demonstra a necessidade de fortalecer, nas universidades, uma educação crítica, libertadora e transformadora. “Nossa missão é formar pessoas que possam transformar a sociedade. Não podemos mudar tudo sozinhos, mas podemos educar para que elas mudem. O projeto da ONU Mulheres é fundamental, e a Universidade La Salle está junto nessa luta.”

A cultura Hip Hop demonstra um compromisso com o investimento em suas origens e desenvolvimento.

O rapper, ativista do Hip Hop e do movimento negro Rafael Diogo dos Santos, também conhecido como Rafa Rafuagi, fundador do primeiro Museu da Cultura Hip Hop da América Latina, relembrou a trajetória do movimento e anunciou investimentos para expandir a campanha. “Em 2018, a partir da Casa da Cultura Hip Hop de Esteio, criamos o coletivo Hip Hop Linha do Trem, que promoveu as primeiras capacitações de homens com homens com o objetivo de combater o machismo. Esse processo transformou não somente a minha forma de agir como cidadão, mas também como liderança cultural.”

Como ressaltou Rafuagi, não há como uma campanha obter adesão sem investimento. “Não se combate a violência contra a mulher, o racismo ou a homofobia sem recursos. Por isso, o Museu da Cultura Hip Hop vai destinar R$ 100 mil na próxima campanha e R$ 24 milhões nos próximos quatro anos para levar a iniciativa às periferias. Nossa equipe é formada em 55% por mulheres, inclusive na alta gestão. Desejamos que essa campanha alcance quem mais necessita. Essa luta é de todos nós, e precisamos avançar urgentemente.

Políticas públicas e engajamento masculino

Autoridades e representantes de diversas instituições destacaram a necessidade da união no combate à violência contra a mulher durante o lançamento da campanha “Fim da Linha”.

A procuradora-geral de Justiça da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul, Sílvia Pinheiro de Brum, destacou que o feminismo demonstra que a luta só tem relevância quando realizada em conjunto com outras pessoas e instituições. “Eu sinto muito intensamente essa união. Nós estamos todos juntos lutando pelo fim da violência contra as mulheres”, declarou.

Ela afirmou que a Defensoria desenvolve, no âmbito do programa “Defensoria Para Elas”, ações como grupos reflexivos para adolescentes em situação de conflito com a lei, o Projeto Praças, que atua com homens privados de liberdade, e o Chega Disso, direcionado às escolas. “A violência contra a mulher precisa ter visibilidade. As pessoas têm que ver para acreditar”, concluiu.

O governo assume seu dever.

O deputado estadual Adão Pretto Filho (PT), coordenador da Frente Parlamentar de Homens pelo Fim da Violência contra as Mulheres, destacou a necessidade de compromisso do poder público. “O Rio Grande do Sul se destaca como um dos estados mais violentos da federação. Isso se deve à falta de investimento e a um olhar sensível do estado. Ficamos satisfeitos com a retomada da Secretaria de Políticas para as Mulheres, resultado da mobilização das mulheres”.

O parlamentar defendeu que o enfrentamento à cultura machista seja abordado desde a infância no ambiente escolar. “Desejamos que todas as escolas públicas, e almejamos também as privadas, consigam incorporar essa temática no currículo, para que, no mínimo uma vez por semestre, se discuta a Lei Maria da Penha. Só assim a geração futura terá outra perspectiva sobre a sociedade”, ressaltou.

Diz o deputado, em conversa com o lado tradicionalista, que o gaúcho forte não maltrata a mulher. Acompanhamos juntos pela luta contra a violência doméstica.

Protagonismo e mudança de consciência.

O presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Edegar Pretto, ressaltou que o protagonismo na luta contra a violência é das mulheres, mas destacou a importância do engajamento masculino. “O protagonismo da luta pela igualdade, pelo combate à violência, pelo combate ao machismo é das mulheres há mais de 100 anos. Nós, homens, nunca tivemos um movimento organizado nacionalmente para isso. Jamais andaremos à frente; queremos estar ao lado dessa luta que as mulheres fazem de forma organizada há tanto tempo”, afirmou.

Segundo o dirigente, o Comitê Gaúcho do HeForShe é o único regional do mundo. Ele também reforçou que não basta apenas políticas públicas: “Nem todo o orçamento dos governos será suficiente se não mudarmos a consciência dos homens, se não mudarmos essa cultura machista que oprime, machuca e mata. Cada um precisa dar um passo à frente no seu dia a dia, dentro de casa, nas empresas, nas escolas e nas universidades, para encurralar essa violência que não tem explicação”.

Pretto mencionou vivências como a campanha da Máscara Roxa, desenvolvida durante a pandemia, que converteu drogarias em locais de apoio a mulheres em situação de violência, e o engajamento de torcidas do Grêmio e do Inter em iniciativas de conscientização. Ele também anunciou que a Conab irá alocar R$ 200 mil ao Comitê Nacional do HeForShe.

A iniciativa converte locomotiva em local de denúncia e reflexão.

A campanha publicitária “Fim da Linha para a Violência contra a Mulher”, criada pela Agência Moove, emprega o metrô para conscientizar sobre violência doméstica. Com a pergunta instigante “Voltar para casa dá medo?”, a ação visa engajar a sociedade em relação a uma das formas mais comuns de agressão contra as mulheres: a que ocorre no âmbito doméstico.

Segundo o diretor da agência, Ricardo Bottega, a seleção do trem está relacionada à rotina de milhares de pessoas que transitam diariamente entre casa e trabalho. A companhia transportou, nesta segunda-feira (2), 100 mil pessoas. Com extensão de 43,8 km, a empresa opera em seis dos principais municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre. “O trem representa o ir e vir do dia a dia, e é o lugar ideal para provocar essa reflexão e estimular a ação contra a violência doméstica”, explica a equipe criativa.

As peças da campanha empregam imagens de residências e edifícios estilizados, que evocam rostos com hematomas, lágrimas e expressões de sofrimento. Nos vitrais, cenas sutis indicam conversas familiares, enfatizando o choque entre a noção de lar como ambiente de segurança e sua efetivação como palco recorrente de violência. Em todas as peças, são ressaltados os canais de denúncia, incluindo o 180 e outras plataformas de apoio às vítimas.

Intervenções no trem e nas estações

Uma das principais ações da campanha será a aplicação de adesivos em vagões de trem com imagens de residências, convertendo o transporte público em meio de comunicação. Nos veículos, a ideia é produzir a impressão de se estar em um ambiente doméstico, com pinturas, carpetes e relógios, para evocar a lembrança de que são ali que ocorrem diversas agressões.

A campanha também provoca uma reflexão sobre o tempo: ao passo que uma viagem entre estações pode durar 20 minutos, o tempo que uma mulher necessita para relatar um abuso pode atingir cinco anos. A comparação visa sensibilizar para a importância da denúncia e do apoio.

Adicionalmente, a iniciativa contempla outdoors, placas, adesivos de piso e vídeos animados distribuídos nos pontos de embarque, atraindo a atenção dos usuários.

Ações e envolvimento cultural

Entre as iniciativas criativas, a banda Nenhum de Nós adotará temporariamente o nome “Todos Nós”, reforçando a ideia de que o combate à violência doméstica é uma responsabilidade coletiva. O grupo também aceitou regravar uma de suas músicas mais conhecidas, Camila, com uma nova letra, que cita nomes de mulheres vítimas de agressões, simbolizando as milhares que sofrem diariamente no Brasil.

A violência contra a mulher impacta toda a sociedade.

Ao Brasil de Fato RS, Thedy Corrêa destacou a urgência do engajamento. “Os números subiram em uma escala impressionante, não só os feminicídios, mas também as ameaças e as tentativas. E temos agora de volta uma ferramenta muito importante, porque lutamos bastante tempo pela reativação do comitê.”

Destacou-se a importância do investimento, dos recursos e da participação ativa de todos os envolvidos. “É preciso ter pessoas comprometidas, e o comitê reúne um grupo considerável de pessoas dispostas a dedicar tempo e energia a essa causa.”

Por fim, Corrêa ressaltou que a violência contra a mulher é uma violência contra a raiz da família. “Todos nós somos filhos de alguém. A origem de tudo está no amor pelas nossas mães. Quando isso é negado, quando tantos filhos perdem suas mães, vemos que não é apenas uma questão das mulheres. As mulheres são a origem da nossa sociedade. Se não tivermos consciência disso, estaremos em um caminho de autodestruição”, concluiu.

Fonte por: Brasil de Fato

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