Brunello di Montalcino: Nova era de elegância e frescor. Produtores como Argiano e Cerbaiona buscam equilíbrio entre tradição e novos estilos, adaptando-se às mudanças climáticas e às demandas do mercado
Poucos vinhos carregam um peso histórico tão grande quanto o Brunello di Montalcino. Nascido na segunda metade do século XIX, pelas mãos da família Biondi-Santi, na Toscana, o Brunello surgiu como um projeto claro de vinho de prestígio, longevidade e identidade territorial.
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A ideia era simples e, ao mesmo tempo, revolucionária para a época: isolar uma seleção especial da Sangiovese local, vinificar com rigor extremo e criar um tinto capaz de atravessar décadas em garrafa. Nascia ali não apenas um vinho, mas um conceito de tempo, paciência e valor.
A “receita” original era marcada por colheitas tardias, fermentações longas, extração firme e estágios prolongados em grandes tonéis de carvalho. O resultado eram vinhos austeros, de taninos marcantes, acidez elevada e uma curva de evolução que exigia anos, às vezes décadas, para atingir seu auge.
Durante muito tempo, Brunello foi sinônimo de espera. E isso ajudou a moldar sua aura de exclusividade.
Com o passar das décadas, Montalcino se organizou, cresceu e ganhou relevância internacional. A denominação oficial, criada em 1966, consolidou regras rígidas como: uso exclusivo de Sangiovese, longos períodos mínimos de envelhecimento, delimitação clara de território.
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E esse modelo funcionou. O Brunello virou um símbolo global de vinho italiano de alta gama, com preços que acompanharam sua fama.
Mas o mesmo sistema que construiu o mito também passou a conviver com tensões. De um lado, a tradição. De outro, um mercado global em transformação, com novos consumidores, novas referências de estilo e uma busca crescente por vinhos mais acessíveis em sua juventude.
Uma nova geração em movimento.
Nomes como Cerbaiona, Stella di Campalto, Ciacci Piccolomini, Le Chiuse, Castello Romitorio e Argiano representam bem esse movimento. A base continua sendo a Sangiovese, o território permanece no centro da identidade, mas o caminho da vinificação mudou.
A extração passou a ser mais delicada. As macerações, mais curtas. O uso da madeira, mais criterioso. A leitura de terroir ganhou protagonismo. O foco saiu da potência pura e migrou para a precisão. O objetivo agora é construir Brunellos que expressem solo, altitude, exposição e clima com mais clareza, e que entreguem prazer mais cedo, sem abrir mão da capacidade de envelhecimento.
Dentro desse novo cenário, a Argiano talvez seja um dos casos mais emblemáticos de transformação recente em Montalcino. Desde a safra de 2018, a vinícola passou a ter a assinatura integral do enólogo Bernardino Sani. O impacto dessa autonomia técnica é visível no perfil dos vinhos.
Há uma mudança clara de leitura de terroir, de construção de taninos, de precisão aromática e de frescor.
A safra 2018 marcou uma virada de posicionamento no mercado. A Argiano passou a figurar com mais regularidade entre os grandes Brunellos da região. O preço acompanhou esse movimento. O reconhecimento veio rápido, tanto da crítica quanto do mercado em geral.
Em uma conversa recente com Margherita Mascagni, brand ambassador da Argiano, pude provar lado a lado os Brunellos 2020 e 2021 da casa. Uma degustação didática que ajuda a entender não apenas a filosofia atual da vinícola, mas também o momento climático e estilístico de Montalcino.
A safra 2021 ainda não está disponível nem na Itália e foi apresentada oficialmente no Benvenuto Brunello. A partir de fevereiro, estará no mercado brasileiro, pela importadora Aurora / Inovini, a partir de 1.200 reais a garrafa. Desde já, esse vinho desponta como uma das grandes safras da região.
O vinho combina frescor vibrante, austeridade bem desenhada e uma concentração de fruta que define os grandes Brunellos. Há tensão, precisão e um desenho de taninos que aponta claramente para uma longa vida.
Clima, safras e decisões de estilo Essas duas safras lado a lado também ajudam a ilustrar o peso crescente das decisões de vinificação em um contexto de mudanças climáticas. Anos mais quentes exigem ainda mais precisão na colheita, no manejo do vinhedo e na extração.
Anos mais frescos permitem construir vinhos mais tensos, verticais e longevos. O desafio do produtor hoje não é apenas interpretar o terroir, mas também reagir com inteligência ao clima de cada ano. O mercado de vinhos mudou profundamente na última década.
O consumidor busca mais informação, mais diversidade, mais experiências. Há menos apego automático a rótulos históricos e mais abertura para novos estilos, desde que tenham identidade. Ao mesmo tempo, há uma pressão por preços mais racionais dentro do segmento premium.
Nesse contexto, o Brunello enfrenta um dilema clássico: como manter sua identidade de vinho de longa guarda e, ao mesmo tempo, dialogar com um público que quer degustar melhor agora. A resposta de parte da região tem sido essa nova leitura de elegância, frescor e taninos mais refinados.
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