Pesquisadores Identificam Níveis Elevados de Substâncias Tóxicas em Brinquedos no Brasil
Uma pesquisa conduzida pela Universidade de São Paulo (USP) em colaboração com a Universidade Federal de Alfenas (Unifal) revelou a presença de altos níveis de substâncias tóxicas em brinquedos plásticos comercializados no Brasil. O estudo, que analisou 70 produtos de fabricação nacional e importados, é o mais abrangente já realizado no país sobre contaminação química em produtos infantis. Os resultados foram publicados na revista Exposure and Health.
A análise, financiada pela Fapesp (21/03633-0 e 23/11634-2), expôs que muitos brinquedos não atendem às normas de segurança estabelecidas pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia) e pela União Europeia. Um caso particularmente preocupante envolveu o bário, com 44,3% das amostras ultrapassando o limite permitido, atingindo concentrações até 15 vezes superiores ao valor regulamentar. A exposição ao bário pode resultar em problemas cardíacos e neurológicos, como arritmias e paralisias.
Além do bário, a pesquisa identificou níveis elevados de chumbo, crômio e antimônio. O chumbo, conhecido por causar danos neurológicos irreversíveis em crianças, problemas de memória e diminuição do coeficiente de inteligência (QI), foi detectado acima do limite em 32,9% das amostras, com concentrações quase quatro vezes maiores do que o permitido. O antimônio, associado a danos gastrointestinais, e o crômio, considerado carcinogênico, apresentaram irregularidades em 24,3% e 20% dos brinquedos, respectivamente.
“Esses dados revelam um cenário preocupante de contaminação múltipla e falta de controle. Sugerimos medidas mais rigorosas de fiscalização, incluindo análises laboratoriais regulares, rastreabilidade dos produtos e certificações mais exigentes, especialmente para itens importados”, afirmou Bruno Alves Rocha. O trabalho é resultado da pesquisa de pós-doutorado de Rocha, apoiada pela Fapesp e concluído durante seu período como professor visitante na Unifal.
Os brinquedos foram selecionados para representar diferentes faixas socioeconômicas, com compras realizadas em lojas populares e shopping centers de Ribeirão Preto. Muitos tinham formatos e tamanhos que facilitavam a exploração oral – ou seja, que pudessem ser levados à boca – aumentando o risco de exposição a substâncias tóxicas. A identificação e a contagem das substâncias foram realizadas por meio de ICP-MS (espectrometria de massa com plasma indutivamente), uma técnica que permite detectar metais e diversos não metais em concentrações muito baixas. Os pesquisadores também utilizaram processos de análise conhecidos como digestão ácida assistida por micro-ondas, que simulam a liberação de substâncias químicas pelo contato com a saliva das crianças.
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O estudo identificou 21 elementos com potencial tóxico: Ag (prata), AI (alumínio), As (arsênio), Ba (bário), Be (berílio), Cd (cádmio), Ce (cério), Co (cobalto), Cr (cromo), Cu (cobre), Hg (mercúrio), La (lantânio), Mn (manganês), Ni (níquel), Pb (chumbo), Rb (rubídio), Sb (antimônio), Se (selênio), Tl (tálio), U (urânio) e Zn (zinco). A partir dessa análise, foram montados dois cenários de exposição às substâncias tóxicas: um normal, com base em valores medianos, e outro de alta exposição, baseado em valores máximos.
Os pesquisadores investigaram as taxas de extração – a liberação das substâncias por contato com o suco gástrico – que variaram de 0,11% a 7,33%, indicando que apenas uma pequena fração dos contaminantes totais é liberada sob condições que simulam a exposição oral. Apesar desse achado positivo, a preocupação com a segurança não é eliminada, considerando as altas concentrações totais detectadas em muitas amostras.
O estudo também contribuiu para mapear a cadeia de produção dos brinquedos e identificar possíveis fontes de contaminação. Foi observado que brinquedos de cor bege apresentaram concentrações mais altas de metais, possivelmente ligadas ao fornecedor da tinta, o que sugere uma pista relevante para futuras ações de fiscalização.
Além dos elementos tóxicos, o grupo de pesquisadores já investigou a presença de substâncias capazes de interferir no sistema hormonal, como bisfenóis, parabenos e ftalatos, conhecidos como disruptores endócrinos.
“Esse não é o primeiro estudo com resultados tão alarmantes, o que só reforça a necessidade de ações urgentes para proteger a saúde das crianças”, concluiu Bruno Alves Rocha. O artigo “Potentially toxic elements in brazilian toys: a bioaccessibility-based childhood health risk assessment” pode ser lido em: https://link.springer.com/article/10.1007/s12403-025-00731-2.