Audiência sobre Porto Alegre: críticas e elogios se alternam sem aprofundamento do Plano Diretor

O evento de participação social reuniu 50% do público previsto pela Smamus no último sábado (9).

11/08/2025 13:39

6 min de leitura

Audiência sobre Porto Alegre: críticas e elogios se alternam sem aprofundamento do Plano Diretor
(Imagem de reprodução da internet).

A audiência pública do Plano Diretor de Porto Alegre, realizada no último sábado (9), reuniu 1.517 pessoas das 3.131 inscritas para a atividade. A Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) contabilizou 1.517 participantes no auditório Araújo Vianna, que possui 3.146 assentos.

A proposta de revisão do Plano, cuja minuta ultrapassa 100 páginas e está dissociada da Lei de Uso e Ocupação do Solo, foi apresentada entre as 11h e as 13h.

A explicação foi ministrada pelo secretário Germano Bremm, diretor da Smamus, e pela arquiteta Vaneska Paiva Henrique, coordenadora de Planejamento Urbano da Capital. Destacaram que as densidades propostas para Porto Alegre foram resultado de uma análise de adequação do uso do solo para o aumento da ocupação.

A verticalização apresentada no documento, com altura máxima de 130 metros em certas áreas, está vinculada à largura da testada do lote, que corresponde à medida da fachada voltada para a rua. Para edifícios com alturas próximas aos 130 metros, a recomendação é que a testada seja de, no mínimo, 50 metros.

Quanto à distinção entre o Plano Diretor e a Lei de Uso e Ocupação do Solo, Germano e Vaneska destacaram que se trata de um modelo adotado por outras cidades brasileiras, como São Paulo, Curitiba, Salvador e Fortaleza.

Leia também:

Conforme o Sul21 vem noticiando, tanto o adensamento a partir da verticalização quanto a separação dos regramentos é alvo de críticas por parte do judiciário, de entidades ligadas ao urbanismo e de ativistas do meio ambiente.

Na segunda-feira (4), o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MPRS) divulgou um estudo técnico-jurídico que questiona a ênfase excessiva no aumento da construção, principalmente por meio da verticalização, sem assegurar mecanismos eficazes para impulsionar o crescimento populacional e a habitação de interesse social. Já o Instituto dos Arquitetos do Brasil – Departamento do Rio Grande do Sul (IAB-RS) publicou uma análise técnica apontando onze inconsistências na proposta do novo Plano Diretor, incluindo a ausência de resposta a eventos climáticos extremos e os riscos da remoção de moradores de baixa renda de áreas da Capital.

Manifestações

Na audiência deste sábado, a tarde foi dedicada às manifestações de 134 inscritos, que tiveram dois minutos para falar no microfone do auditório. As contribuições se dividiram entre críticas à proposta do governo de Sebastião Melo (MDB) para o planejamento urbano da Capital e elogios ao novo Plano Diretor, principalmente por parte de empresários e representantes da Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura – Rio Grande do Sul (AsBEA RS).

As primeiras declarações foram interrompidas por vaias, tanto de apoiadores de Melo quanto de pessoas contrárias à proposta. Os favoráveis ao governo, contudo, pareciam estar em clara maioria no Araújo Vianna.

“Fiquem à vontade para vaiar”, declarou o secretário Bremm, mesmo sendo alvo das manifestações, justificando que as vaias fazem parte do processo democrático.

Felisberto Luisi, conselheiro do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (CMDUA), foi alvo de vaias recorrentes em sua apresentação na audiência do Plano Diretor. Imagens: Bettina Gehm/Sul21

Entre as manifestações positivas, destacou-se a do empresário Arthur Duarte, um dos sócios da Space Hunters, empresa de geomarketing que oferece consultoria à Prefeitura no programa Centro Mais.

Muitos dos que atualmente não estão participando, são aqueles que não se informaram sobre o funcionamento da cidade. Nosso centro histórico está desaparecendo, e os bairros consolidados expulsam cada vez mais os mais pobres para fora. O que está sendo proposto é uma maneira para que a cidade possa respirar novamente. Precisamos garantir que a cidade densifique nas áreas consolidadas, para que as pessoas, e não só as ricas, possam morar perto do trabalho.

O presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), Heverton Lacerda, destacou que o Plano Diretor não está pronto para ser levado à votação na Câmara Municipal devido à falta de espaço para a participação da sociedade na elaboração da lei. Ele também questionou quais são os dados de infraestrutura que embasam a nova altura e o adensamento propostos e onde estão disponíveis esses dados.

Na decisão proferida nesta sexta-feira (8), revertida pelo TRF4, a 5ª Vara Federal de Porto Alegre determinara que o Município de Porto Alegre disponibilizasse, de forma organizada, a relação e a íntegra de todos os processos SEI vinculados à revisão do Plano Diretor, incluindo as atas de reuniões, documentos elaborados, relatórios sobre produtos contratados e manifestações técnicas da equipe executora.

As contribuições online ao novo Plano Diretor foram estendidas até o próximo sábado (16).

Ausência de transparência

A presidente do IAB-RS, Clarice Misoczky de Oliveira, questionou os números sobre a participação pública no processo de revisão do Plano trazido pela Prefeitura, que incluem 142 reuniões dos Grupos de Trabalho e 27 eventos nas Regiões de Planejamento. “Todos os técnicos também assinam as atas de participação, e eles são parte interessada. Então, esse número não é real”, pontuou Clarice.

Dúvidas sobre a transparência do processo têm gerado insegurança jurídica desde a última eleição para o Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (CMDUA). Em fevereiro de 2025, a 4ª Vara da Fazenda de Porto Alegre decidiu pela anulação da eleição. A decisão acolheu ação movida por diversas entidades do setor que apontaram irregularidades no edital e no processo eleitoral – que modificou a disposição da Lei Complementar nº 434/1999 e o Decreto Municipal nº 20.013/2018, ampliando a interpretação da lei no que se refere às entidades de classe e afins ao planejamento urbano.

A presidente do IAB acrescentou que também existe a segunda conferência, que ocorreu sob determinação judicial com caráter meramente consultivo, não deliberativo, e é apresentada como uma etapa de participação no relatório.

Clarice ressaltou que o aumento da densidade previsto na revisão do Plano Diretor reduzirá o custo da produção do metro quadrado para o mercado imobiliário, porém não para o consumidor final. “São apartamentos para investidores. Assim, o adensamento não resolverá o problema do déficit habitacional”, afirmou.

Para a especialista, faltou detalhamento da minuta do plano durante a explicação neste sábado. “A minuta é uma linguagem jurídica, é uma linguagem muito difícil, mas trechos dela deveriam ter sido incorporados na apresentação, para que se entendesse o rigor do que estava sendo de fato apresentado. É o modelo de cidade que está em disputa aqui.”

Fonte por: Brasil de Fato

Autor(a):