Fiquei chocada e indignada com a notícia divulgada nos últimos dias sobre o projeto-piloto do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e do secretário estadual da Educação, Renato Feder, que emprega plataforma digital (Inteligência Artificial) por meio de câmeras nas salas de aula e outros ambientes das escolas, para monitorar os alunos, mesmo durante as aulas. Essa ação suscita diversas dúvidas acerca da privacidade, segurança e viabilidade educacional.
Qual o objetivo de uma medida como esta? Em que a vigilância anônima sobre estudantes de 8, 10, 11, 13 ou 15 anos contribui para a sua aprendizagem? Em que essa vigilância poderá contribuir para a melhoria da qualidade do ensino? Onde se encontra o direito à privacidade de nossos estudantes?
Você se sentiria confortável com a vigilância constante de suas atividades diárias? Trata-se de jovens, em processo de formação em todas as esferas, fase na qual a socialização, a naturalidade e a espontaneidade são elementos fundamentais e não podem ser restringidos por meio desse tipo de vigilância. Parece evidente que esse projeto do governo, agora do conhecimento público, como é direito inalienável da sociedade, poderá ter impactos negativos na saúde mental e no bem-estar dos estudantes.
No livro 1984, o escritor inglês George Orwell apresentou o Grande Irmão, um governante autoritário onipresente e onisciente, que por meio de câmeras e monitores vigiava e determinava o comportamento de cada indivíduo em uma sociedade distópica de um futuro sombrio. Na rede estadual de ensino, o Grande Irmão já se insinua por iniciativa da dupla Tarcísio-Feder.
Na realidade, existem várias razões para essa iniciativa. Assim como no estado do Paraná, onde também foi secretário da Educação, Renato Feder, um empresário do ramo de tecnologia, implementa na rede estadual de ensino de São Paulo dezenas de plataformas digitais, ao custo anual de R$ 500 milhões, segundo dados de 2024.
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O impacto dessas plataformas na melhoria da qualidade do ensino é praticamente nulo. Em contrapartida, observa-se maior vigilância, controle, autoritarismo, assédio moral e outras consequências negativas. A inadequação desse sistema, considerando que as tecnologias de informação e comunicação deveriam ser elementos auxiliares no processo educativo, se manifesta na notícia de que estudantes estão utilizando as plataformas para fraudar provas e trabalhos escolares.
Uma justificativa para isso reside em desviar a atenção da sociedade da falência das políticas educacionais do governo, que prioriza interesses empresariais em detrimento da formação básica sólida de nossos estudantes. A prioridade é formar mão de obra, privatizar, controlar e militarizar as escolas.
O governo demonstra priorizar o controle e a vigilância, em vez de investir em estratégias que fomentem a aprendizagem e o desenvolvimento dos estudantes. Essa postura pode desviar o foco de questões cruciais, como a escassez de recursos, a formação de professores e a adequação da infraestrutura escolar.
Não toleramos tal situação. Formalizamos representação no Ministério Público Estadual para combater essa ilegalidade inconstitucional. Não possui lógica alguma. Mesmo não faz sentido a presença de câmaras nas salas de aula, um ambiente que deve ser destinado a professores e estudantes, garantindo liberdade, privacidade, livre debate, para que todos possam manifestar suas dúvidas, ideias e conhecimentos, sem o temor de vigilância e avaliação por terceiros em relação à relação professor-estudante.
A utilização de câmeras em salas de aula pode gerar desconfiança e insegurança, impactando negativamente o relacionamento entre professores e alunos. A tecnologia não deve nos levar a retroceder.
A deputada Bebel é representante do PT-SP e a segunda presidente da Associação dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP).
Este é um artigo de opinião e não necessariamente reflete a linha editorial do Brasil do Fato.
Fonte por: Brasil de Fato