A luz é um dos aspectos mais essenciais para a vida. Desde os primeiros raios solares que iluminam o planeta, ela determina os padrões da natureza, controla o desenvolvimento das plantas e guia os animais em seus hábitos diários. Para os seres humanos, essa função é ainda mais complexa: a luz atua como um sinal biológico principal, responsável por coordenar o relógio interno que controla o sono, o ânimo, a energia e até o metabolismo.
Nesse contexto, emergem os estudos sobre o uso terapêutico da luz, tanto em formas tradicionais quanto em abordagens mais recentes, como a fotobiomodulação.
A influência da luz no organismo e na cognição.
O cérebro humano contém um núcleo especializado denominado supraquiasmático, situado no hipotálamo, que atua como o “relógio central” do organismo. Esse relógio é ajustado diariamente através da exposição à luz que incide na retina. Pela manhã, sobretudo com a presença de comprimentos de onda mais curtos, como a luz azul, há uma inibição natural da melatonina (o hormônio do sono) e um estímulo à liberação de cortisol em níveis adequados, preparando o corpo para estar alerta. Ao anoitecer, a redução gradual da luminosidade indica que é hora de descansar.
Contudo, a modernidade transformou drasticamente essa relação. Anteriormente, o ser humano residia em harmonia com o amanhecer e o anoitecer, mas atualmente passamos extensos períodos em ambientes fechados, sob iluminação artificial de baixa intensidade diurna, e estamos sujeitos a telas de dispositivos móveis e computadores durante a noite. Esse padrão desorganiza a estrutura do sono, compromete a recuperação noturna e eleva a suscetibilidade ao estresse e à ansiedade.
Pesquisas já comprovaram essa relação. Uma meta-análise publicada no Journal of Sleep Research (2023), que analisou 13 ensaios clínicos, revelou que a terapia com luz intensa pode otimizar a manutenção do sono, diminuindo as ocorrências noturnas de despertar. Apesar de não haver impacto consistente sobre a duração total do sono ou o tempo necessário para adormecer, o fato de proporcionar uma noite mais contínua já representa um ganho significativo para indivíduos com insônia.
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Fotobiomodulação: energia terapêutica além da luz intensa.
A luz branca intensa pode reprogramar o relógio interno, e a fotobiomodulação atua além disso, operando no nível celular. Nesta técnica, utilizam-se lasers e LEDs com comprimentos de onda específicos no espectro vermelho e infravermelho (geralmente entre 630-670 nm e 800-1100 nm) para estimular processos bioquímicos fundamentais.
A luz do laser ou do LED, ao atingir as células, é absorvida pelas mitocôndrias (chamadas de “usinas de energia” da célula), ativando a enzima citocromo c oxidase. Essa ativação desencadeia diversas reações celulares: aumento da produção de ATP (combustível das células), modulação de espécies reativas de oxigênio, liberação de óxido nítrico e melhora da circulação sanguínea. Na prática, isso resulta em células mais energizadas, tecidos melhor oxigenados e uma resposta inflamatória mais equilibrada.
No sistema nervoso, a fotobiomodulação transcraniana (tPBM) tem recebido atenção especial. Estudos indicam que a aplicação de luz vermelha e infravermelha em regiões pré-frontais do cérebro pode elevar o metabolismo energético do córtex e otimizar a dinâmica sanguínea cerebral. Esses efeitos são de particular relevância, considerando que o córtex pré-frontal é responsável pela regulação emocional, tomada de decisões e controle da resposta ao estresse. Assim, ao aprimorar o desempenho bioenergético dessas áreas, a PBM fornece suporte biológico para o equilíbrio mental.
Uma pesquisa publicada na Frontiers in Psychiatry em 2024 confirmou esse potencial. A investigação demonstrou que a fotobiomodulação ocasionou uma diminuição moderada dos sintomas depressivos em pacientes em acompanhamento, além de indicar efeitos promissores no controle da ansiedade. Já um estudo clínico controlado com placebo, publicado no Journal of Clinical Sleep Medicine em 2023, revelou que indivíduos que receberam sessões de fotobiomodulação no pescoço antes de dormir relataram maior relaxamento, melhora na qualidade do sono e sensação de mais energia ao despertar.
Experiência clínica e percepções dos pacientes
Na prática clínica, a fotobiomodulação tem apresentado resultados positivos no controle do estresse e na melhora da qualidade do sono. Os aparelhos utilizados possibilitam a precisão na seleção do comprimento de onda, da dose e do tempo de aplicação, de acordo com as necessidades de cada paciente, considerando suas características clínicas e individuais. As sessões devem ser conduzidas sempre sob o acompanhamento de um profissional habilitado em laser, assegurando segurança e eficácia. Além da aplicação transcraniana, existem protocolos direcionados à circulação sanguínea (fotobiomodulação vascular), que estão sendo investigados em estudos sobre estresse e qualidade do sono.
A metodologia científica é essencial, porém a vivência dos pacientes também se mostra esclarecedora. Diversos relatos indicam que, após algumas semanas de exposição luminosa organizada ou de sessões de fotobiomodulação, notaram o despertar mais tranquilo, a diminuição dos intermitentes acordares noturnos e a obtenção de uma serenidade mental antes inatingível. Outros relatam melhora do ânimo, maior nitidez no raciocínio e renovado entusiasmo para o cotidiano.
Essas percepções correspondem ao que os estudos têm demonstrado: a luz, utilizada de maneira planejada e segura, pode se tornar uma ferramenta eficaz contra o estresse, a ansiedade e a insônia.
A utilização da luz para fins terapêuticos tem ganhado espaço em todo o mundo. O que antes era restrito a estudos experimentais, atualmente se manifesta em protocolos clínicos e recursos disponíveis para o dia a dia.
Dra. Lara Motta – CRBM: 631.877 | CRO: 74.516, PhD em Ciências da Saúde – UNIFESP Biomédica, cirurgiã-dentista especialista em dor e habilitação em laser e biofotônica.
Fonte por: Jovem Pan