A ex-presidente do Senado da Bolívia, Adriana Salvatierra, alerta para o grave risco de o MAS desaparecer do cenário político
Um líder relevante do partido declara que a administração econômica do governo atual conduzirá à legenda a um resultado eleitoral negativo.

A cientista política e ex-presidente do Senado da Bolívia, Adriana Salvatierra, acredita que o Movimento ao Socialismo (MAS), partido fundado por Evo Morales, enfrenta risco de extinção após as eleições do próximo domingo (17).
Isso ocorre se a legenda não atingir 3% dos votos na eleição presidencial. Em entrevista ao Brasil de Fato, em Santa Cruz de La Sierra (Bolívia), ela aponta a crise econômica do país e o cisma no MAS como principais causas da crise interna e do enfraquecimento da maior estrutura política do país.
A trajetória de Salvatierra foi ascendente na política boliviana. Em 2005, ingressou no MAS, partido recentemente fundado por Evo Morales. Dez anos depois, foi eleita senadora e, em janeiro de 2019, aos 30 anos, assumiu a presidência da Casa Legislativa. Quatro meses depois, renunciou ao cargo, após o ex-presidente deixar o comando do país.
Com a eleição boliviana se aproximando, prevista para o próximo domingo (17), Salvatierra tem sido uma das vozes mais críticas em relação à divergência no MAS após o desentendimento público entre Evo Morales e o atual presidente do país, Luis Arce.
A disputa eleitoral provocou uma transformação no panorama político do país. Após duas décadas, a Bolívia deverá escolher um presidente que não pertença ao MAS. O candidato mais cotado para a disputa presidencial é o empresário Samuel Doria Medina, do Aliança Unida, que sofreu derrotas nas eleições de 2005, 2009 e 2015 para Evo Morales.
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A transcrição da entrevista com Adriana Salvatierra está abaixo:
Brasil de Fato: Qual o futuro do Ministério das Mulheres após as eleições deste domingo?
Adriana Salvatierra: O MAS é o maior partido da história da Bolívia, com 1 milhão de militantes registrados e vitórias consecutivas desde 2005, sempre no primeiro turno. Contudo, Luis Arce, com sua gestão econômica deficiente, reduziu o partido de 55% para cerca de 1% das intenções de voto. Com menos de 3%, o MAS perde a sigla. Existe, portanto, um risco sério de desaparecimento, causado não apenas pela má administração, mas também pelo esvaziamento de dois capitais: o político, que tirou mais de 3 milhões de bolivianos da pobreza, e o organizativo, que era a maior estrutura de mobilização do país.
A ameaça de perder a sigla é avaliada somente pela eleição presidencial?
Sim. Em nosso sistema, os votos para presidente também determinam a eleição de parte dos deputados e todos os senadores. Dessa forma, se o candidato presidencial não alcançar o percentual mínimo, isso compromete a existência legal do partido.
Estudos apontam para a vitória de Samuel Doria Medina ou Jorge Quiroga. Um governo deles poderia garantir o respeito à Constituição progressista alcançada no governo Evo Morales?
A crise econômica enfraqueceu a credibilidade das ações em nome da esquerda. Houve a desconstrução do papel do Estado na economia, a perda do controle da taxa de câmbio e dos preços, e uma redução intencional do investimento público. Isso contribuiu para o argumento de que o déficit fiscal é responsabilidade das empresas estatais e dos incentivos. Atualmente, existe um acordo em determinados setores da sociedade em eliminar os subsídios, sem considerar o impacto sobre as famílias mais vulneráveis. Considero que essa crítica não é suficiente para desmantelar o Estado Plurinacional, devido à busca por soluções urgentes para problemas como a inflação, que atingiu 10% em maio e pode chegar a 20% ao final do ano, e o baixo crescimento econômico, o mais grave em 25 anos.
A privatização de empresas públicas demandaria alterações na Constituição?
Sim. A nossa Constituição determina que os recursos naturais estratégicos não podem ser privatizados, uma vez que pertencem ao povo e são administrados pelo Estado. Qualquer iniciativa de privatização requer emenda constitucional.
Como você descreveria Medina e Quiroga?
São representantes de uma direita associada ao processo de privatizações dos anos 1990. Doria Medina, ao ser ministro do Planejamento, afirmava que privatizaria uma empresa estatal por dia. Quiroga, no curto período em que foi presidente (2000-2001), esteve ligado a massacres contra o movimento campesino indígena. São sinônimo de repressão e privatização.
Após o Brasil, a China é o principal parceiro comercial da Bolívia? Sim, os países do BRICS representam mais de 60% das exportações bolivianas.
Medina tem declarado que busca aproximar a Bolívia dos Estados Unidos. Qual a sua opinião sobre isso? O desafio não reside nos acordos comerciais, que já são superiores aos de 2005, mas sim quando estes se baseiam na lógica da submissão, que interessa aos Estados Unidos. E acredito que a Bolívia não pode aceitar essa condição.
Fonte por: Brasil de Fato